Educação de QUANTIDADE. Sobre o Projeto Mundiar

Semana passada, em reunião ocorrida em Santarém, gestores da rede estadual foram, entre sorrisos e palavras bem articuladas, “convidados” (para não dizer intimados) a implantar em todas as escolas da rede o Projeto “Mundiar”. Sempre tive vontade de abordar o tema. Eis que surge a oportunidade.

Como parte do “Pacto pela Educação”, o Mundiar chegou ao Pará em 2014, ampliou-se em 2015 e agora em 2016 a ordem é partir para o ataque total. Não é a toa que no início de fevereiro a Seduc baixou edital para seleção de professores, objetivando atender exclusivamente os estudantes do Mundiar.

Sobre o projeto, sabe-se que a mais relevante virtude é a redução da distorção idade/série. O aluno do Mundiar completa o ensino fundamental em 2 anos e o ensino médio em 18 meses.

Tem-se ainda que o projeto é cria da Fundação Roberto Marinho/Rede Globo e que sua chegada ao Pará veio de uma parceria com o governo de Simão Jatene, o qual pretende, com o Mundiar, aumentar nossos indicadores, em 30%, ao longo de cinco anos.

Uma outra curiosidade é que se você jogar no google a textual “Projeto Mudiar” descobrirá, a primeira vista, que tudo que se refere a ele está diretamente vinculado ao Pará, ou seja, apesar do desnível idade/série ser uma problemática nacional, nossas crianças e jovens serão as grandes “cobaias” deste método inovador que até agora é tão nosso quanto o açaí e o carimbó.

Também entra como dado interessante (e por que não dizer sedutor, especialmente para quem não quer gastar com a educaçao!?) o fato de que no Mundiar quem dá aula é a televisão. Existe a figura do professor (pode ser de qualquer área do conhecimento) que se limita a controlar a TV, trocar os CDs, voltar “a fita”, etc. Lembrando que este único docente, no caso de dúvidas dos alunos, pelo que está no projeto, conta com o suporte de outros professores com especialidades diversas (isso não sei se na prática tem ocorrido).

Para quem ainda não entendeu por que ter uma televisão ministrando aulas, assessorada por um professor, é vantajoso (não para o discente, mas para o governo), explico melhor. A grosso modo, quem financia a educação nas unidades federativas são os estudantes. Cada estudante recebe um valor/ano. É do valor repassado ao conjunto de estudantes que o estado paga o professor. Logo, enquanto uma turma do médio regular com 40 alunos, banca de 10 a 12 docentes/ano para uma formação que se dará em 36 meses, uma turma do Mundiar com os mesmos 40 estudantes banca um único professor/ano (a televisão com certeza não é assalariada) em uma formação que durará 18 meses.

Para quem quer precarizar e privatizar com uma só tacada, está aí um grande achado.

Pois bem, após este breve relato, o qual pode estar sendo injusto e/ou impreciso em alguns pontos (tudo por pura falta de dados oficiais), ficam algumas questionamentos que merecem respostas, não apenas para mim, mas principalmente para a comunidade escolar.

Quanto a Fundação Roberto Marinho está levando dessa “parceria” instituída com o governo de Simão Jatene? O valor justifica a aquisição? Quanto o governo vai economizar com esta política e que destino pretende dar e/ou já deu aos valores economizados?

O que Jatene está pensando para os docentes efetivos da rede, visto que dados oficiais mostram que no ensino fundamental a defasagem idade/série atinge 47% dos estudantes e no médio 63%, ou seja, em 5 anos (agora 3) mais da metade dos estudantes migrarão das turmas regulares para o Mundiar, para o qual a Seduc está promovendo seleção específica?

Tirando a redução do desnível idade/série e a consequente melhoria do Ideb, que com certeza virá, visto que o problema da distorção é um calo no sapato das escolas que pretendem melhorar os resultados, o que o Mundiar de fato oferece às nossas crianças e jovens em termos de qualidade? Este público sairá da educação básica reunindo as habilidades e competências necessárias para intervir na sociedade de forma autônoma? Penso que a experiência das EJAS estão aí para nos dar alguns direcionamentos.

E, finalmente, e não menos importante, quem será responsável em equipar as escolas com as ferramentas devidas para a implantação do Mundiar? Corre à “boca pequena” que as escolas têm de garantir os equipamentos. Se for, é bom avisar com atencedência para já incluirmos entre os objetivos da Festa Junina 2016. Lembro que já temos um “Chocobingo”, agendado para abril, objetivando a aquisição de um projetor de imagens, que, a princípio, não era para o mundiar.

Por: Prof. Márcio Pinto
Dirigente Sindical e
Vice-Diretor Eleito da Escola Estadual Plácido de Castro/Santarém

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