Parece piegas usar um hit da década de 1980 para iniciar uma discussão sobre ensino modular, porém para a professora de História da 20ª URE, Marilene Valente, a música “Alagados” da Banda Paralamas do Sucesso tem muita relação. “A questão do SOME é estrutural mesmo e no caso das ilhas é um dos maiores problemas, além das dificuldades de deslocamento, falta de água potável, entre outros. Vale lembrar que Sistema Modular só funcionará com qualidade se houver a parceria entre o Estado e os municípios, por isso uma das propostas é que a parceria seja formal, o que sabemos que não acontece. Eu como professora das ilhas posso falar que em Ponta de Pedras, por exemplo, não temos nem moradia. Da última vez que estive lá nós professores que fomos atrás de casa para alugar, o que não é nosso papel e nos causa uma série de conflitos. Agora diga, é ou não uma arte atuar no interior?”, questiona Marilene Valente.
Criado no inicio da década de 1980 e tendo a 1ª gerência da Fundação Educacional do Pará (FEP), o Sistema de Organização Modular de Ensino (SOME) surgiu como um “tapa-buraco” para os municípios que não tinham escolas para a demanda de ensino no Estado do Pará. Em 1982 o SOME passou para a responsabilidade da Secretaria de Estado de Educação (SEDUC) e no mesmo ano houve a homologação da resolução nº161/82 de 03.11.82. O sistema é estruturado em módulos de disciplinas, aplicadas por professores(as) itinerantes que levam a grade curricular dos ensinos fundamental e médio às populações do campo, das águas e das florestas.
Mesmo apresentando constantes deficiências, o SOME do Pará serviu de modelo para outros Estados do Brasil, como o Amapá, por exemplo, e chega hoje a abranger 98 municípios e cerca 460 localidades espalhadas pelo Pará inteiro.
A Coordenação Estadual do SINTEPP nunca escondeu o posicionamento questionador ao método utilizado pelos sucessivos governos para suprir a necessidade de escolas em regiões mais distantes dos centros urbanos, por perceber a precariedade na implantação do Some. “Não somos contrários ao projeto, porém percebemos nele inúmeras deficiências que precisam ser ajustadas urgentemente. Uma solução seria a estruturação concisa e a ampliação do SOME, ou como o Governo queira nominar essa política pública, para atendimento da necessidade da população das diversas regiões de nosso Estado”, explica Braulio Uchôa, coordenador estadual de Educação no Campo e Ribeirinha do SINTEPP.
Retomando um pouco mais da história, lembramos que em 2003 o SOME sofreu o golpe da redução drástica na gratificação de deslocamento, aliada ao fim da obrigatoriedade dos convênios estabelecidos nos municípios. A medida já denotava no período uma explicita intenção de forçar o esvaziamento de professores(as) do projeto, o que justificaria sua motivação de acabar, seria a morte por inanição (falta de professores). Mas a categoria junto com as comunidades/localidades ao lado do SINTEPP foi às ruas e às lutas para reverter o quadro imposto pelo governo da época. Para que não houvesse outro golpe, nossa Direção amarrou a gratificação no PCCR. Neste ano de 2013 os(as) professores(as) continuam e não esmoreceram na luta. Em audiência realizada com Governo do Estado no final de janeiro mais uma vez a coordenação do SINTEPP apresentou os problemas estruturais detectados nas diversas regiões onde existe o SOME. No entanto não houve um retorno conciso às demandas, apenas o recebimento das mesmas para averiguações.
Na manhã do dia 05/02 na sede de nossa entidade foi realizada assembleia especifica dos(as) professores(as) do SOME que contou com representantes de cerca de 20 municípios entre eles Cametá, Capitão Poço, Abaetetuba, Conceição do Araguaia e outros. Depois da apresentação de um apanhado geral das condições estruturais e pedagógicas do projeto nos municípios avançou-se para a pauta principal: Lei especifica do SOME e Assédio Moral. Foi consenso que o Art. 9 do Projeto de Lei de Regulamentação e Funcionamento do SOME é mais uma tentativa do governo Jatene de retirar o direito a educação básica de várias comunidades do campo. “Quando o Governo limita o mínimo de alunos ele fere o ECA, que diz que toda criança e adolescente tem direito à educação básica, como observado no Art. 53, parágrafo 5, Por isso nos posicionamos completamente contrários ao Art. 9 e propomos sua reformulação”, explica Braulio Uchôa.
Para o SINTEPP fica cada vez mais contundente que o Governo Tucano mascara e justifica as péssimas condições de trabalho com a gratificação, o que na maioria das vezes não cobre as doenças contraídas nos ambientes insalubres a que os(as) profissionais vem sendo expostos(as). Outra importante demanda é quanto ao não recebimento da gratificação quando na licença saúde e na licença prêmio, ao que o Governo alega inconstitucionalidade. Porém, não precisamos ir longe para buscar posicionamento contrario; no vizinho Estado do Amapá o pagamento é feito normalmente, não onerando os(as) trabalhadores(as) no momento em que mais precisam.
Sabemos que os desafios impostos são inúmeros, por isso entendemos também que não é hora de recuar. Muito pelo contrário, é hora de se unificar e fortalecer as frentes. Por isso a assembleia estabeleceu como desdobramento uma nova audiência com o Governo, para tentativa de manter o diálogo, o que já foi solicitado pela Direção do SINTEPP e que terá como pauta principal novamente a Lei Específica do SOME para debate dos pontos controvertidos e outras demandas, em especial as de cunho estrutural. “A luta dos(as) professores(as) do SOME não é unilateral, ela se insere nos eixos gerais da categoria. Nossa campanha já está na rua e os(as) educadores(as) do SOME estão atentos e somarão, com as devidas ressalvas de não abrir mão de suas especificidades”, afirma Braulio Uchôa.